quarta-feira, maio 05, 2004

PEOPLE DON'T CHANGE


Eu sempre acreditei na máxima "pessoas não mudam". Não sei exatamente por que, nunca tive nenhuma explicação que comprovasse ou refutasse essa "teoria", simplesmente acreditava nisso e pra mim era suficiente. Bom, hoje eu acho que já tenho alguns argumentos que de certa forma comprovam, ou ao menos servem de consolo para mim. Pessoas realmente não mudam. O estranho é que ao longo desse texto eu vou praticamente me contradizer pois vou falar a respeito de um monte de coisas que mudaram na minha vida, e tudo vai levar a crer que eu mudei - mais de uma vez. Será mesmo?

Então vamos a razão principal para eu ter vindo aqui mais uma vez externar meus pensamentos batendo meus dedinhos nessas teclas brancas que são surradas todos os dias. De um tempo pra cá minha vida tem mudado muito, tanto externamente - ou seja, as coisas que aconteceram comigo: término de um relacionamento amoroso duradouro, mudança da casa por onde morei durante todos os 25 anos da minha vida, mudanças na vida profissional, etc - como internamente. E uma dessas coisas realmente me surpreendeu acima de todas as outras, foi ela o fato de eu ter simplesmente perdido o meu tesão em fumar maconha, diminuido drasticamente o meu consumo, sem para isso ter passado por nenhuma auto-privação ou coisa do gênero.

Vamos a uma breve historia da minha relação com a erva. Comecei a fumar no reveillon de 1999 para 2000, foi exatamente meu primeiro baseado, que pedi para um amigo apertar pra mim, uma decisão 100% minha com nenhuma influência. Pois bem, fumei quase nada depois disso, apenas algumas vezes com esse mesmo amigo, e com alguns outros. Alguns meses depois, em abril iniciei o relacionamento com a Jô, que desgostava do fato de eu fumar. Inúmeras conversas sobre o assunto, mas normalmente era sempre a mesma preocupação, se meu consumo ia escalar, como acontece com a maioria das pessoas que iniciam no consumo de alguma droga psicoativa. Eu sempre garantia que não, que sempre ia fumar só de vez em quando, comprar nem pensar. Eu queria acreditar nisso. Mas não foi nada disso, meu consumo escalou, e escalou rápido. Ao fim do meu primeiro ano de maconheiro eu já fumava praticamente todos os dias, no segundo ano minha média ja havia subido para no mínimo um baseado por dia e vários no fim-de-semana; algo que eu havia prometido a ela e a mim mesmo que não ocorreria virou rotina, eu estava fumando em casa escondido - direto. Isso pode ser considerada uma mudança em mim? Ou apenas a droga agindo e criando uma dependência químico-psicológica no meu organismo? No meu ver, apenas a 2a opção. Eu nunca deixei de ser o Christian e sempre reconheci que de certa forma, aquele consumo diário era maléfico para o meu corpo bem como pra minha cabeça e principalmente pro meu espírito.

Passei a estudar o assunto, muito, decidi me tornar um entendido de cannabis, seus efeitos na sociedade e no comportamento das pessoas. Começei a frequentar o Growroom, site sobre cannabis e seu cultivo. Me identifiquei imediatamente com todos os maconheiros de lá, participando de discussões sobre todos os aspectos do consumo da cannabis. Dos mais "valorosos", como os danos a saúde e sociedade, aos mais fúteis como as "melhores maneiras de apertar um baseado". Chegou um período da minha vida onde a maconha era o centro das minhas atenções, ou estava fumando, ou estava pensando em fumar ou estava estudando alguma coisa sobre o assunto, ou escrevendo um texto relacionado, etc. Isso não é lá muito saudável e eu tinha plena conciência disso, mas não conseguia me "livrar". Tentei inutilmente reduzir meu consumo dando paradas programadas, ficando uma ou duas semanas sem fumar, ou passando um mês sem comprar. Num adiantava nada, assim que eu "voltava", vinha com tudo. E assim foi indo a minha vida, eu estacionei em um desconforto com o meu próprio comportamento.

Pois bem, de um tempo pra cá (digamos 6 meses), eu começei a ficar tão instasfeito com tudo que começei a tentar me achar. Terminei meu namoro. Tentei fumar menos, sem sucesso mais uma vez. Então eu entrei pra analise e para a Yoga simultaneamente. Não sei em que nivel cada uma teve o efeito em mim, acredito que a Yoga teve participação maior, por que poucas vezes me identifiquei tanto com uma atividade na minha vida. Recentemente (nem dois meses) a minha vontade de fumar maconha simplesmente foi sumindo, não chego mais em casa pensando no baseado clássico antes de dormir. Não fico mais preocupado quando a maconha tá acabando. Aliás, nem quero mais comprar, cansei de prensado de má qualidade e caro. Isso então pode ser considerada uma MEGA mudança no Christian né? Pode ter certeza. Estou tão impressionado com tudo isso que tive que vir aqui e escrever isso tudo. O incrível é que isso tudo foi totalmente involuntário. Eu perdi a vontade de fumar, não penso mais em maconha, enjoei de acessar o site (Growroom), mesmo por que perdi o interesse no assunto como um todo, apesar de todas as minhas convicções continuarem (ainda sou totalmente a favor da legalização, continuo dizendo e ainda tenho muito a dizer sobre a relação da sociedade com as drogas, etc).

Só pra não me chamarem de hipócrita, continuo fumando e não pretendo parar. Gosto muito de fumar maconha, inclusive, chegar na minha atual relação com a droga foi um balanceamento perfeito e muito desejado. Sou muito tolerante a THC e quanto mais fumava menos aproveitava. Agora cada vez que fumo fico chapado de verdade.

Não to querendo dar exemplo de nada pra ninguém. Quem fuma todo dia, 20 vezes por dia e tá feliz, ótimo, continue fumando. Mas uma coisa é certa, a droga tem mais controle sobre você do que você imagina. A "mudança" que ocorreu em mim foi a prova disso e agora vem meu argumento, que eu deveria ter começado la em cima.

Eu não mudei, eu sempre fui o Christian, Chris, Tetê, Mizi, Lemming, baforito, Meriadoc, whatever. Mas minhas atitudes e visões foram alteradas por fatores externos, sendo o principal deles (na recente história) a maconha. Mas no âmago do meu ser (eita expressão ridícula), na essência, eu sempre fui o mesmo, tanto que o desejo de encontrar equilíbrio na minha vida sempre existiu, e agora acho que estou chegando perto. Não dá pra falar "faça Yoga e encontre equilibrio", "fazendo Yoga você vai parar de fumar maconha em 6 meses". Isso faz parte da MINHA essência, que é exclusiva e pode não ter nada a ver com você que tá lendo isso agora.

Instaurou-se uma nova fase na minha vida. Parei de comer carne vermelha, parei de tomar Coca-cola, bani fast-food da minha existência e algumas outras porcarias. Isso tudo foram decisões conscientes, que requerem força de vontade. Eu amo carne e Coca-cola. Isso pode ser considerado uma mudança em mim? Não. Foram apenas decisões seguidas de realizações. Uma pessoa não é definida por coisas tão pequenas. É muito mais complexo e ao mesmo tempo muito mais básico que isso. O núcleo não muda, no máximo muda a casca ou escama, mas essa pode ser trocada, que nem acontece com cobras e camaleões. Eu posso amanhã virar punk, ou um monge tibetano, mas garanto, vou continuar sendo o Christian, gostando de carne e Coca-cola. Talvez inclusive um dia de tanto tempo ficar sem essas coisas eu até as esqueça e não faça mais esforço para me privar delas, e se bobear até passar mal se daqui a 20 anos comer um bife, mas deixar de gostar? I don't think so. Tá bom, paladar pode não ser o melhor dos argumentos pra definir o núcleo de um ser, mas dá pra entender aonde eu quero chegar.

O que define então uma pessoa? Sei lá. Senso de humor, vícios, virtudes, valores, índole, crenças. São tantas coisas e ao mesmo tempo nenhuma. Mas no fundo no fundo, pessoas não mudam, nasci Christian, vou morrer Christian, mesmo que, aos olhos dos outros, possa ter me transformado 300 vezes ao longa da minha passagem pela Terra. Adaptação, adequação, busca de equilíbrio, não mudança. People don't change!