quarta-feira, janeiro 26, 2005

GRUPOS, TRIBOS E GALERAS


Vamos então nesse momento falar dessas coisas, e das definições, como todo bom filósofo. Falar isso por que, essas palavras são muito usadas em nossas vidas mas raramente temos noção da importância que têm e até que ponto afetam nossos julgamentos, decisões, e finalmente, nossos objetivos e aspirações.

Começemos pelo que considero mais complicado, as tribos. Quando essa palavra nos vem a cabeça, pensamos em quê? Em índios né? E realmente, isso está correto, pois eles são o melhor exemplo do que significa uma tribo. Estão todos lá, convivendo harmonicamente, com os mesmos costumes, as mesmas vestimentas, basicamente as mesmas regras de conduta, os mesmos objetivos, a mesma área física, etc. O homem é tribal desde que existe nesse planeta. Sempre se aglomerando com indvíduos que "pensam parecido" e que "querem basicamente as mesmas coisas". As diferenças de ideais das tribos geraram as primeiras guerras que o mundo conhece, e até hoje são os mesmos motivos, pois países e continentes nada mais são que enormes tribos.

O que então, resumindo o resumo, define uma tribo? Hummmm, difícil, deixa eu pensar. Conjunto de pessoas que compartilham costumes, rituais, regras morais (ética e leis), objetivos e espaço físico. Trazendo essa definição pro século XXI, nem precisa mais dividir o espaço físico né? Internet ta aí pra isso. Surfistas, skatistas, budistas, envangélicos, sem-terra, vagabundos; tudo isso é bom exemplo de tribo.

Agora grupos. Grupo não é tão complicado, por que é muito comum, e basicamente tudo é grupo; galeras e tribos também são grupos. Mas para essa tese, um dos mais importantes de ser corretamente compreendido. Grupo é qualquer aglomeração de pessoas, pode ser em um espaço físico, ou não. Se você está na fila pra pagar o almoço, a fila é um grupo. Qdo você vai a um show, toda aquela multidão em volta de você é um enorme grupão. Uma sala de chat na internet é um grupo.

E galera? Bom, galera é bem óbvio. Galera é o seu grupo de amigos. Aqueles que você "escolhe" para serem o seu círculo mais próximo de amizades. Aqueles com quem você sempre sai, sempre conversa, vão no seu aniversário, você vai no deles. Viajam juntos, estudam juntos, trabalham juntos, etc. Pode ser meio confuso definir "exatamente" quem é sua galera, mas se você pensar 5 minutinhos, consegue, mesmo que ela seja composta de apenas umas duas ou três pessoas. Ou você pode simplesmente NÃO ter uma galera, ser um "sem galera", ter vários (ou nenhum) amigos e várias (ou nenhuma) galeras mas nenhuma que te prenda.

Voltando aos grupos. Poucas pessoa se dão conta de como eles afetam nossas vidas, nossas decisões, julgamentos e ações. Eu dei o exemplo de fila de restaurante; ninguém percebe que "está fazendo parte" de um grupo nesse momento, mas está. Você está seguindo as regras do grupo fila, andando em linha, sempre a passos curtos, sem furar, sem falar muito alto, esperando sua vez, etc. Claro que sempre existem excessões, pessoas que não se comportam como deveriam. Mas se você pensar bem, até essa analise das excessões, ou seja, daqueles que nao estão em exato acordo com o que você considera correto para aquele momento, tem a ver com o grupo. Se uma pessoa fura a fila, ela não está sendo intrinsicamente mal-educada; ela simplesmente feriu a ética do grupo fila. Pode o estar fazendo por desconhecimento das 'regras' ou por que é um idiota mesmo. Geralmente assumimos a segunda possibilidade, até automaticamente.

Quando fazemos parte de um grupo, automaticamente, parte da nossa consciencia se dedicará ao grupo, para formar uma consciencia coletiva dando ao grupo as vezes mais poder que ao individuo para decidir o curso de ação. Vou citar um caso bem extremo disso para demonstrar o que acabei de dizer. (infelizmente não lembro os dados exatos) Ocorreu certa vez, em um restaurante, em algum lugar da asia central, um incendio, onde morreram mais de 200 pessoas. Todos ali dentro faziam parte de um grupo - clientes do restaurante. O incendio comecou na cozinha, todos os cozinheiros fujiram e se salvaram, mas os clientes, descrentes do que estava acontecendo, não fujiram e morreram todos. E por que isso? Pois ninguem teve a coragem de ferir o comportamento básico do grupo e ser o primeiro a fugir sem pagar a conta, isso poderia ser muito mal visto caso o incêndio fosse um alarme falso ou algo assim. O grupo nesse caso falou mais alto que o individuo; não houve comunicação suficiente entre os membros para que uma decisão fosse tomada, simplesmente todos esperaram que alguem tomasse uma atitude, e acabou que ninguem tomou, o grupo "tomou" a decisão por todos. Estranho né?

Isso é uma coisa que estamos apenas começando a entender, mas já é, de certa forma, prova do que alguns estudiosos vinham dizendo a décadas atrás. De que não somos tão conscientes de nós mesmos como achamos. Temos a visão errônea de que a nossa consciencia (seja isso o que for) nos acompanha sempre e só desliga quando dormimos. Isso está errado, nosso nível de consciência é muito mais baixo do que imaginamos, simplesmente não sabemos que somos, por fazemos certas coisas. Muitas das coisas que fazemos no dia-a-dia são atos mecânicos e repetitivos. Quanto menos consciente, mais o grupo afetará seus julgamentos e ações.

Agora vamos falar um pouco de tribo. Pessoas precisam de tribos, por que o ser humano vive uma busca sem fim por aceitação e reconhecimento. Então ele procura pessoas que vão entender ele e/ou apreciar as coisas que ele diz e faz. Se você nascer em uma tribo, os costumes e regras vão ser forçados em você desde criança, você não vai ter como resistir a eles, e vai se tornar um membro da tribo, queira ou não. Mais tarde na vida, pode acontecer de lampejos de consciencia te indicarem que seu indivíduo não encaixa com aquilo, e você vai se rebelar. Outra possibilidade é você não ter nascido em tribo alguma, mas sinta necessidade de uma.

Pessoas que buscam auto-afirmação, buscam tribos. Isso é fácil de observar na adolescencia, quando o sexo começa a aflorar e homens e mulheres precisam se mostrar para o mundo para quem possam ser notados e conseguir parceiros e amigos. Uns viram skatistas, por achar eles bem moderninhos. Outros, mais revoltados, viram góticos ou punks. Outros viram ativistas políticos, tem muito a dizer (e geralmente, muito menos a fazer). Em alguns casos existe realmente uma identificação com a tribo escolhida e as coisas dão certo, mas há casos (diria eu, a maioria) em que é tudo falso e forçado. Um garoto apenas vira skatistas por que sabe que a menina que ele está afim gosta de skatistas. Uma menina vira ativista política por que quer provar para o mundo que não é uma idiota, ou até, para se impor por sua inteligencia, por que de repente, lhe falta beleza.

Os motivos são infinitos, mas o que se tem que entender é que raramente são legítimos. As pessoas se frustram, as vezes estragam suas vidas por andar com as pessoas erradas, são falsas consigo mesmas ao fingirem certas "crenças" ou ao seguir certos ritos. Mudam de tribo, procurando se encaixar melhor. Claro que existem também os SEM TRIBO, que também podem o ser por estarem em cima de um pedestal e não querer seguir a modismos ou por medo de perder sua individualidade. Isso é uma grande idiotice. Ninguém perde individualidade por dividir ações, pensamentos e objetivos com grupos e tribos, o máximo que se perde é o ego, e não há nada de mal nisso, pelo contrário.

As frustrações encontradas ao ingressar ou sair de uma tribo, ou até ao fracassar em fazê-lo tendem a gravar profundas e péssimas impressões no inconsciente e subconsciente - colaborando bastante pra que tenhamos uma má auto-imagem, baixa auto-estima e cada vez menos fé no ser humano. Tendemos a projetar na tribo em si o problema "são muito panelinha", "são muito chatos, não fazem nada", "só tem gente burra, abaixo do meu nivel". Coisas que falamos para nós mesmos, em pura e simples mentira, para esconder a rejeição ou desadequação, mas racionalmente isso não funciona. São problemas nossos e somente nossos que vão fazer funcionar ou não nosso relacionamento com determinada tribo; nada de errado, inclusive, se certo dia você achar que não faz mais parte daquilo e sair, ou se nem ingressar por achar que (ainda) não é o momento.

O problema é você sair de uma e ir pra outra julgando e maldizendo a(s) anteriore(s). Lembre-se sempre que você ja foi um dos membros e os que estão lá agora são você ontem. É o clássico caso de quem para de fumar e passa a falar mal de cigarro e dos fumantes quase que instantaneamente em um ato de pura hipocresia. E o pior, depois volta a fumar.

Errado (nossa, mas esse menino é muito marrento - errado? quem lhe outorgou a verdade absoluta pra usar um termo desse? well, c'est la vie... continuando) também é julgar uma pessoa pela(s) tribo(s) da qual ela faz parte, pois como ja falei la em cima, muitas vezes os motivos de ingresso e permamanência muitas vezes são falsos e forçados. Além do mais, é uma questão de lógica inversa; não se conceitua uma pessoa pela tribo e sim a tribo pelas pessoas. Cada membro da tribo contribiu para a formação do que a tribo é em sua essência. Tá, me chamem de idiota, extrapolando esse conceito para um país fica muito complicado aceitar que EU (ou você) tenho participação ativa na representação do Brasil, por exemplo.

Ah é? Então vamos aos meus exemplos mirabolantes e quase sempre frustradamente cômicos. Digamos que uma menina de Minas venha passar o carnaval no Rio e por aqui fica com um menino, apaixona-se e vive um amor de verão. No último dia, ao inves de ir levá-la na rodoviaria ele não aparece. Dias depois ela descobre que ele estava ficando com sua melhor amiga que pode ficar no Rio após o feriado prolongado. Voltando a Minas e conversando com as amiguinhas, a seguinte estupidez é proferida com unanimidade de aceitação: "Carioca é tudo galinha". Sacaram? :P

O ser humano experimenta tribos, para experimentar a si mesmo. Da mesma maneira que experimenta roupas e comidas novas. Será que vou gostar? Só vai saber se tentar. Preconceito é exatamente falar que é ruim antes de provar, é julgar uma tribo pelo que os outros falam e não pelo que você descobriu. Não julgue, estude, aceite, compreenda. Compreenda a si mesmo e a sua tribo antes de tentar entender e julgar as outras. (não era bem esse o intuito desse texto, mas eu sempre me empolgo e acabo mudando de assunto, então acho melhor eu parar por aqui, hehehe)